sexta-feira, 30 de julho de 2010

La Valse Des Monstres

Neste momento tenho esta música em loop. Foi porque abri de repente o iTunes e estou com uma vontade estranha de escrever mas não consigo escrever com nexo. Gosto mais do título que da música em si, principalmente porque não sabia que os monstros dançavam. Mas gosto da palavra monstros. E a minha preferência fica por aí.
Gosto da palavra monstros porque não fui eu quem lhe deu significado. Um dia disseram-me que os monstros eram coisas más e a imagem mental que criei, quando existe, é escura e desfocada. Entretanto, penso que monstros se calhar somos nós, simples e meros mortais inspirados por espírito crítico que, em última análise, nos leva ao fim, à morte.
É um pouco irónico que esteja a falar da morte poucas horas depois de ter sido informado que o actor António Feio faleceu. Não sou de dar títulos a quem morreu. Não sou de passar a gostar de quem morreu. Para mim as pessoas não ganham altares quando morrem, apesar de achar que sou das poucas pessoas neste mundo que pensa assim. Não sou contra as homenagens, mas acho monstruosamente inacreditável que não se fale de xis ou de ípsilon enquanto está vivo e que passe a ídolo de não sei onde quando morre.
A valsa dos monstros continua a tocar. Ainda não vi o filme, mas a alegria não é do conceito de monstro que me instituíram. Se calhar os monstros são bípedes e andam por aí, nas esquinas, a pisar a calçada, enquanto vou passear até ao jardim mais próximo, ou ao café. Se calhar os monstros são meus amigos. Se calhar os monstros não são maus e eu até me dou com eles. Se calhar todos somos monstros. E, se calhar, monstros até é um elogio.
“O espaço está desarrumado e o silêncio é cortado pelo vento que faz bater as portadas das janelas velhas. A casa foi limpa ainda ontem e os pequenos tufos de pó trazem ao nariz a comichão e dá vontade de arrancar o nariz”. A comichão é a repulsa pelos não-monstros. Monstros pode não ser uma palavra má. Eu até acho piada.  As pessoas da minha idade talvez se lembrem do vestido amarelo da Bela e da juba do Monstro. Não me lembro de alguma vez ter visto o filme todo. Nem sei a história, mas de certeza que acaba bem. Não quero estar a falar mal dos filmes da Disney, porque são os meus favoritos. Só quero falar mal das pessoas que não gostam dos monstros. Se alguma vez os monstros vos fizeram algo de mal, revoltem-se, façam uma petição e acaba-se a história dos monstros serem amigos, mas eu prefiro a palavra “mau”. Uma pessoa é má, e não o monstro que lhe chamam.
Até prova em contrário, eu gosto de monstros. Acabei de ir contra um. É uma senhora. Desculpe, digo-lhe. Agarro-lhe a mão e pergunto. Dá-me a honra desta dança. A música já está a tocar.
Boa noite.